Histórias
das lutas na cidade de Rio Claro (3): representatividade mundial, consolidação
e diversificação das práticas.
Histories of the fights in the city of Rio
Claro (3): world representativity, consolidation and diversification of
practices
Fernando Paulo Rosa de Freitas (Mestre em
Ciências da Motricidade Humana – UNESP – Rio Claro. Professor de Educação
Física da Rede Pública de Ensino do Estado de São Paulo. E-mail:
fer_edfis@hotmail.com).
Resumo:
Esta é a terceira parte de um artigo que trata do processo histórico das lutas
ocorrido na cidade de Rio Claro, estado de São Paulo, Brasil. As informações
contidas nesse trabalho são resultado de pesquisa bibliográfica e entrevistas
com pessoas que têm ou que tiveram relação com as lutas e artes marciais
durante suas vidas. Tem como objetivo preservar e divulgar essas informações de
maneira geral e, em especial, subsidiar o ensino das lutas nas escolas.
Palavras-chave:
Lutas; História; Cidade de Rio Claro.
Abstract: This is the third part of an article that discusses
the historical process of the fights occurred in the city of Rio Claro, São
Paulo, Brazil. The information contained in this work is the outcome of
bibliographic research and interviews with people who have or who have had
relationship with the fights and martial arts during their lives. It aims to
preserve and disseminate this information in general and, in particular,
support the teaching of fights in schools.
Keywords: Fights; History; Rio Claro City.
Resumen:
Esta es la tercera parte de un artículo que analiza el proceso histórico de las
luchas que tuvieron lugar en la ciudad de Río Claro, Sao Paulo, Brasil. La
información contenida en este trabajo es el resultado de investigación
bibliográfica y entrevistas con personas que tienen o que han tenido relación
con las luchas y artes marciales durante sus vidas. Su objetivo es preservar y
difundir esta información en general y, en particular, apoyar la enseñanza de
las luchas en las escuelas.
Palabras
clave: Luchas; Historia; Ciudad de Río Claro.
A
luta de braço e o jiu-jitsu moderno: dos primeiros campeões mundiais, das mulheres e da importação e exportação
de profissionais
A prática do “halterofilismo” sempre acompanhou
a das lutas na cidade de Rio Claro. Apesar de muitos dos antigos acreditarem
que o treino com pesos “travava” o lutador, alguns atletas já se utilizavam
desse recurso para melhorar seu rendimento esportivo entre as décadas de 1950 e
1960. Como já mencionado no artigo anterior, antes de montar a primeira
academia de lutas na cidade, professor Uadi Mubarack já treinava levantamento
de pesos, tendo vencido um campeonato estadual. Talvez por essa razão a
academia Gonçalves-Mubarack sempre manteve um espaço destinado a musculação.
Nas
tradicionais academias da cidade que se dedicaram exclusivamente ao
“halterofilismo”, era comum o fato de acontecerem desafios de força, como, por
exemplo, disputas de levantamentos, ou, quem vencia um “braço de ferro” ou
“queda de braço”. Foi dessa brincadeira, depois transformada em esporte, que
saiu o primeiro campeão mundial em uma modalidade de luta em Rio Claro:
Waldemar Bíscaro, campeão mundial de “ArmWrestling”
ou “Luta de Braço”, no ano de 1980, em Calcutá - Índia, categoria até 90
quilos. Waldemar Bíscaro, na verdade, foi o primeiro brasileiro a conquistar um
título de campeão mundial nessa modalidade, juntamente com Roger Pareja,
campeão na categoria até 100 quilos.
Figura 1: A equipe
brasileira de luta de braço em Calcutá. Waldemar Bíscaro, ajoelhado, de blusa
verde.
A conquista de Waldemar Bíscaro em 1980 lhe
trouxe fama na cidade, especialmente, depois de ser entrevistado no programa de
auditório de Flávio Cavalcanti. Essa conquista também incentivou o desenvolvimento
da modalidade da luta de braço na cidade de Rio Claro, que revelou outros
medalhistas em campeonatos mundias: Jose Mario Orsi, Aparecido “Cidão” Santos e,
Paulo César Silva, o “Paulão”, um gigante que jogou basquete pelo time da
cidade e pela seleção nacional. Posteriormente, “Paulão” se tornou mundialmente
conhecido pelo apelido de “Giant Silva”, ao participar de eventos de
Pro-Wrestling e MMA. Conquistas estaduais e nacionais por esses e outros atletas,
então, foram muitas. A Academia Apolo, de Waldemar Bíscaro, acabou se transformando
em um centro regional da luta de braço, recebendo aficionados de outras cidades
para treinos e, invariavelmente, para algum desafio. Esse sucesso da modalidade
fez com que a organização dos Jogos Abertos do Interior de 1986, sediados em
Rio Claro, escolhesse a Luta de Braço como uma das modalidades extras desse
evento. Esse torneio acabou marcado por alguns acidentes, como fraturas de
braços. A equipe de Rio Claro, como se esperava, sagrou-se campeã.
A conquista do campeonato mundial em 1980, no
entanto, somente aconteceu depois de muitos anos de esforço e superação.
Waldemar Bíscaro lembra que, antes que tivesse ouvido falar do professor Uadi
Mubarack e de sua academia, “[...] até mesmo os caras que faziam musculação
faziam escondido, porque havia muito preconceito. Diziam que quem treinava não
crescia, quem treinava era “veado”, e por aí afora”. Explica como eram esses
treinos: “[...] Eu comecei a treinar em fundo de quintal, na casa do “Guido”,
meu amigo. Era mais peso mesmo (anilhas, barras e halteres). Não tinha banco,
não tinha aparelho, não tinha nada. Pegava um método de revista e fazia”. Partindo
do sucesso de sua carreira esportiva, Waldemar Bíscaro organizou diversos
campeonatos de luta de braço, fisiculturismo e de levantamentos em Rio Claro.
Nessas modalidades também ajudou a formar diversos campeões nacionais e
mundiais.
Tratando um pouco mais sobre a relação do treino
de “halteres” com as lutas, diríamos que, se a Academia Gonçalves-Mubarack de
Judô sempre manteve um espaço para o levantamento de pesos, a Academia Apolo,
por sua vez, sempre manteve dois pares de luvas de boxe para quem quisesse se
aventurar em algum desafio que não fosse os de força. Esses desafios, na
maioria das vezes, acabavam virando briga, para a diversão dos presentes. Era
uma coisa bruta, como afirma Waldemar Bíscaro: “[...] Um dia, um cara entrou na
academia e desafiou justo o “Vartão” (Valter Fernandes, ex-campeão estadual de
fisiculturismo). Ai o “Vartão”, que era muito forte, colocou uma luva de dez
onças e perguntou o que deveria fazer. Eu falei: para você não errar o golpe,
bate no meio do peito. O “Vartão” deu um murro no peito dele que o jogou no
meio das barras. Daí esse cara vazou embora”.
Waldemar Biscaro (que já havia treinado boxe
na época em que serviu o exército no Rio de Janeiro) e “Vartão” devem ter sido
os primeiros rio-clarenses a disputar uma luta de boxe na cidade: “[...] Na
década de 1970, eu com o “Vartão” começamos a treinar boxe e lutamos contra a
equipe do Nacional aqui em Rio Claro. Isso foi em 1972, acho. Foi durante a
realização de uma feira, acho que a primeira FACIRC (Feira do Comércio e da
Indústria de Rio Claro), ali no terreno que fica do lado do campo do Rio Claro,
que a prefeitura montou um ringue. Veio o “Luizão Jurado” que já treinava boxe
e que era de São Paulo para lutar pela gente. O Luizão acabou vencendo e nós
dois perdemos nossas lutas”.
A Academia Apolo, além dos treinos, dos
campeonatos e, dos desafios, marcou a passagem dos inúmeros frequentadores
pelas constantes brincadeiras, muitas delas, tão brutas quanto os próprios
treinos. Essas brincadeiras, por fim, acabaram por desenvolver a identidade e a
simpatia que muitos guardam por essa academia e por Waldemar Bíscaro. Muitos de
seus frequentadores, mesmo treinando em outros lugares, voltam a tradicional
academia para rever os amigos e relembrar essas inúmeras histórias. Em se
tratando de treinamento, a Academia Apolo sempre se configurou como um local
destinado a quem procura treinar pesado. Tradicionalmente, também, sempre foi
um espaço predominantemente masculino.
Sobre a participação das mulheres nas
academias e nas disputas de luta de braço Waldemar Biscaro esclarece: “[...] A
mulher do Dr. Laércio Martinez, de Campinas, a Aparecida (Maria Aparecida
Martinez), já participava de competições de luta de braço, assim como a
“Paquita” (Maria Aparecida Collis Jorge), mulher do Hughes Jorge [1]. No
interior do estado as mulheres participavam pouco das academias. Nos grandes
centros, como Campinas e São Paulo, já tinham mulheres que participavam. Depois
de bastante tempo, algumas meninas da equipe de judô feminino do professor Uadi
começaram a disputar, junto com a gente, das competições de luta de braço”.
Depois da luta de braço, a próxima modalidade
de lutas a revelar campeões com resultados em nível mundial foi o jiu-jitsu. Embora
tenha sido esta a primeira modalidade de luta a ser praticada na cidade, o
jiu-jitsu trazido por João Gonçalves Filho, na década de 1950, acabou entrando
em declínio e dando lugar ao judô. O jiu-jitsu só voltou a ser oferecido nas
academias da cidade a partir da dos desafios de vale-tudo que ocorreram início
da década de 1990. No estado de São Paulo esse tipo de espetáculo começou a
reaparecer nas mídias no ano de 1992, com o Desafio Gracie de Vale-Tudo,
realizado no Ginásio do Ibirapuera. Este evento colocou em confronto lutadores
de jiu-jitsu contra lutadores de full-contact,
a fim de estabelecer qual era a luta mais efetiva em um combate sem (ou, quase
sem) regras.
Nesse mesmo evento, Geraldo Pedra,
vice-campeão mundial de kung-fu (wushu)
representou o time do full-contact.
Esse atleta havia se estabelecido na cidade de Rio Claro há pouco tempo, onde
passou a ensinar sua arte marcial e, com quem tivemos certo contato. Lembrança de
uma conversa informal, quando Geraldo Pedra nos contou sobre esse desafio,
dizendo que iria enfrentar “um tal” de Gracie. Imaginamos, na época, ser esta
uma empreitada perigosa, dado que já conhecíamos a fama daqueles lutadores por
meio de um antigo álbum de recortes, apresentado por um professor de judô (Denílson
Rivail Olmo, faixa-preta de judô). Com a luta já marcada e, sem nenhuma informação
que o pudesse ajudar, nos limitamos a alertar para ter cuidado com essa luta.
Naquela época não se tinha muita informação sobre esse tipo de desafio e sobre
as técnicas empregadas, dado que: o jiu-jitsu e o vale-tudo estavam mais
centralizados no estado do Rio de Janeiro; os praticantes que revelassem os
segredos dessa arte marcial eram considerados traidores (“creontes”) e; ainda
não existiam muitos dos meios de informação atual, especialmente, a internet. O
desconhecimento dessas técnicas pela maioria das pessoas fica patente ao se
rever os vídeos remanescentes dessa disputa. Fernando Solera, que comandou a
transmissão desse “vale-tudo” pela Rede Gazeta, não conhecia muitos termos
técnicos que o ajudassem a entender o que se passava [2]. Há de se levar em conta,
também, que a primeira edição do UFC (Ultimate
Fighting Championship), evento que popularizou esse tipo de espetáculo pelo
mundo, só ocorreria um ano mais tarde.
A fama do jiu-jitsu dos Gracie, por sua vez,
fez com que as academias Pessoa e Gonçalves-Mubarack retomassem a prática do
jiu-jitsu. Voltaram a trabalhar com o judô e o jiu-jitsu simultaneamente. A
Associação Gonçalves-Mubarack funcionou assim até seu fechamento, ocorrido
alguns anos após o falecimento do sensei
Uadi Mubarack. A Academia Pessoa, por sua vez, se filiou ao Mestre Orlando
Saraiva e trabalha com as duas modalidades até os dias atuais.
Há de se abrir parênteses aqui para tratar das
primeiras lutadoras da cidade. As pioneiras, nesse caso, foram as irmãs Solange,
Soraia e Simone Pessoa, que se destacaram em competições de judô a partir do
ano de 1979. Soraia Pessoa Vieira conta-nos que começou a treinar com quatro
anos de idade, assim como suas irmãs. Fala dos preconceitos de uma época em que
até correr pelas ruas da cidade não era coisa comum de se ver, quanto mais,
mulheres treinarem um tipo de luta. Em relação a esse tipo de preconceito,
afirma que até algumas pessoas de sua família acreditavam que a prática das
lutas não era coisa boa para meninas.
Ao questionarmos as mulheres participantes
dessa pesquisa sobre as contribuições que a prática das lutas trouxe para suas
vidas, Soraia Pessoa Vieira menciona a disciplina, a preocupação com a
manutenção de uma vida saudável por meio da prática de exercícios físicos e
sentimentos de confiança e de força proporcionados pelo treino do judô. Sua
irmã, Simone, menciona essas mesmas qualidades. Em relação à segurança afirma
que: “[...] o treino (de lutas) dá autoconfiança, mas o medo permanece. Assalto
e estupro continuam, mas podem levar o dinheiro, a dignidade jamais”. Falando
mais sobre a segurança proporcionada pelo treino de lutas, Priscila Matheus
Encinas reforça a percepção das irmãs Pessoa afirmando que: “[...] por ser
lutadora, não que não tenha medo, mas me sinto mais segura para lidar com
situações de estresse, sabendo que posso fazer coisas que outras mulheres não
fazem”. Sendo professora de Educação Física escolar, afirma ainda que: “[...]
Nunca precisei brigar, mas, não tenho receio de apartar uma briga de alunos se
for preciso”. Observa ainda que, por ter sido lutadora de judô, tem facilidade
para ensinar esse conteúdo na escola, a despeito da falta de materiais e
espaços adequados: “[...] Em uma das escolas em que leciono não temos tatame,
nem colchonetes, nem mesmo um gramado, o que poderia ajudar a dar uma aula de
judô. Pensando na segurança dos alunos, acabo não desenvolvendo esse conteúdo
como gostaria. Faço apenas uma introdução da parte em pé do judô. Fico mais nos
conceitos que nos procedimentos e, faço a transposição para outras lutas que
não precisam de espaços específicos, como o uka-uka”. Menciona ainda que a prática
das lutas lhe ajudou a entender o processo de ensino. Afirma ainda que concorda
que o objetivo do ensino das lutas na escola deva ser divulgar essa parte da
cultura corporal e tem restrições ao ensino das lutas nesse ambiente com outros
objetivos, como a defesa pessoal: “[...] Prefiro não arriscar, a não ser para
os mais velhos e, mais pelo lado das atitudes”. Tal posicionamento encontra
paralelo em um trabalho anterior dessa autoria, que trata do ensino do karatê
na escola (Freitas, 2013, p.47).
Voltando a questão do ressurgimento do
jiu-jitsu na cidade, além das academias de judô que voltaram a oferecer essa
modalidade, professores vindos de outros estados começaram a chegar a Rio Claro,
com destaque para Leonardo Santos e Ramon Lemos, vindos do Rio de Janeiro, no
ano de 2000. Depois de um tempo esses lutadores/professores se uniram para dar
aulas na mesma academia, até que “Leo” Santos retornou para o Rio de Janeiro
para se dedicar a carreira de lutador de MMA (Mixed Martial Arts), lutando,
atualmente, no UFC. Ramon Lemos, por sua vez, permaneceu na cidade e formou
diversos campeões, com destaque para os irmãos Rafael e Guilherme Mendes.
Devido a esse grande sucesso, foi contratado para trabalhar como treinador de
grandes lutadores do UFC, como, Rodrigo “Minotauro” Nogueira e Anderson Silva.
Atualmente é head coach de um projeto
de jiu-jitsu em Abu Dhabi.
Assim como aconteceu com a luta de braço e com
a academia de Waldemar Bíscaro, o sucesso dos lutadores treinados por Ramon
Lemos acabou atraindo a atenção. Muitos lutadores de renome no jiu-jitsu vieram
treinar em Rio Claro, como, Claudio Calasans, Gilbert “Durinho” Burns, Rodrigo
Caporal, Gustavo “Guto” Campos, Bruno Frazatto, Ary Farias, entre outros. Esse
agrupamento de lutadores de nível mundial fez com que, na época, a Academia
Ramon Lemos recebesse o apelido de “caldeirão”, sendo normal que fosse visitada
por lutadores de outros locais do Brasil ou do exterior. Vinham à cidade,
muitas vezes, só para conhecer seus campeões, tirar algumas fotos e participar
de um treino. Se esse sucesso teve o mérito de formar e de atrair um grande
número de campeões à cidade, era de se esperar que, em um dado momento,
acabasse se desfazendo: em um espaço restrito economicamente, cada um procurou
seu próprio caminho, fazendo com que a cidade passasse de importadora a
exportadora de profissionais do ensino e do treinamento das lutas. Destacamos
alguns exemplos: Abmar Barbosa foi o primeiro a se mudar para os E.U.A.;
Gilbert Burns (“Durinho”) foi convidado para treinar com Vitor Belfort,
ex-campeão do UFC; Leandro Brassoloto e Rodrigo Caporal chegaram a ensinar o
jiu-jitsu em países como a Bélgica e China, entre tantos outros.
Em se tratando do sucesso esportivo e
profissional alcançado pelos lutadores e professores de jiu-jitsu da cidade de
Rio Claro, vale destacar a família Mendes. Incentivados a treinar desde
crianças por seu primo mais velho, Thiago Mendes, os irmãos Rafael e Guilherme
conquistaram diversos títulos mundiais.
Thiago Mendes passou a ser o responsável pela
parte física do treinamento de seus primos, se dedicando aos estudos e se
especializando no treinamento funcional de lutadores e fitness. Ministra aulas em sua academia, a Octane Studio Personal,
em Rio Claro. Já seus primos, Rafael e Guilherme, passaram a ministrar
seminários pelo mundo afora, sendo convidados a dar aulas particulares para o
Sheik Tahnoon, de Abu Dhabi. Entusiasta dessa arte marcial, Sheik Tahnoon
contratou diversos professores brasileiros para ensinar o jiu-jitsu em seu
país, trabalho agora supervisionado por Ramon Lemos. Por influência de Sheik
Tahnoon, Abu Dhabi organiza um torneio mundial de luta agarrada, o ADCC (Abu
Dhabi Combat Championship), do qual os irmãos Mendes conquistaram diversos
títulos.
Figura 2: Da direita
para a esquerda: Rafael, Thiago e Guilherme Mendes
Em termos profissionais os irmãos Mendes
também têm demonstrado talento e maturidade: fizeram economias a partir dos
seminários ministrados e dos prêmios conquistados em lutas profissionais e
montaram sua própria academia, a Art Of
Jiu-Jitsu, em Tabla Mesa, Califórnia. Com pouco tempo de trabalho, esta já
foi considerada uma das dez academias de jiu-jitsu mais bonitas do mundo por um
site especializado (Muito..., 2015). O
funcionamento dessa academia é explicado pelos irmãos Mendes: “[...] eu (Rafael
Mendes) e meu irmão (Guilherme Mendes) somos os head coaches da academia e temos outros sete professores. São mais
de setenta aulas por semana. Só de aulas para criança são sete por dia, em dois
tatames. Não temos horários em que os tatames ficam vazios. Filmamos todas as
aulas da academia e colocamos em um website e, este é outro negócio. Para você
acessar esse website você precisa pagar uma mensalidade. É uma coisa que deu
certo, porque, muitas pessoas de outros países que querem aprender nossas
técnicas, não podem estar presentes. Então elas assistem à mesma aula que
estamos desenvolvendo na academia. Dentro do jiu-jitsu conseguimos agregar
diversos trabalhos”.
O
estabelecimento do boxe e de outras modalidades de lutas na cidade
Além do jiu-jitsu, do judô, do karatê e da
luta de braço, outras modalidades de lutas começaram a se estabelecer na cidade
de Rio Claro a partir da década de 1990 e início dos anos 2000. O boxe só veio
a se estabelecer na cidade a partir do ano de 2003. Depois de participações
esporádicas de rio-clarenses em lutas de boxe nas décadas de 1970 e 1980, com a
mudança da família Macedo para Rio Claro o boxe começou a tomar um rumo definitivo
e diferenciado. Marcos Macedo, o patriarca da família, foi um dos precursores
do boxe feminino no Brasil e, juntamente com seus filhos, Breno e Leonardo, figuram
entre os primeiros incentivadores do boxe nas categorias menores. Os irmãos
Macedo, além de terem conquistado diversos torneios amadores, também ajudaram a
formar, junto com seu pai, diversos lutadores e lutadoras de nível nacional e
continental. Trabalham com o boxe em diferentes perspectivas: competição, condicionamento
físico e ação social. Na perspectiva social desenvolvem o ensino do boxe em
bairros periféricos da cidade, como Guanabara e Bonsucesso. Têm como objetivo
oferecer uma oportunidade aos jovens carentes, a fim de afastá-los do crime e
do vício.
Outras modalidades de lutas e artes marciais
como o kung-fu (wushú ou boxe chinês), o tae-kwon-do, o krav magá, o boxe
tailandês, entre outras, estão sendo desenvolvidas na cidade de Rio Claro por
professores nativos ou vindos de fora. Essa variedade de lutas e as diferentes
formas e objetivos com que são desenvolvidas oferecem um leque de alternativas
para as pessoas que querem, por meio de seu treinamento, melhorar seu
condicionamento físico, se tornar um lutador amador ou profissional, aprender
uma forma de defesa pessoal, entre outros. Não é mais necessário, como já foi
um dia, viajar para aprender essas modalidades.
Além das academias, as escolas públicas da
Rede Estadual de Ensino do Estado de São Paulo têm ajudado a disseminar o
conhecimento das lutas entre a população rio-clarense. O currículo oficial do
estado relaciona cinco modalidades de lutas para serem abordadas nas aulas de
Educação Física, a saber: o judô (4º bimestre / 7º ano); o karatê (1º bimestre
/ 8º ano); a capoeira (1º bimestre / 9º ano); a esgrima (4ºbimestre / 1ª série)
e; o boxe (1º bimestre /3ª série). Com objetivos diferenciados, sem contar com
os espaços e materiais específicos, ministradas por professores não
especialistas e, dividindo o pouco tempo disponível com outros conteúdos, é de
se esperar que o ensino das lutas nas escolas fique bastante restrito. Por
outro lado, possibilita que um maior número de pessoas conheçam alguns aspectos
dessa parte da cultura corporal. No que se refere ao trabalho dos professores,
estes podem explorar o ensino das diferentes modalidades de lutas por meio de
conceitos, práticas e atitudes.
Conclusões
Uma das primeiras constatações ao iniciar os
trabalhos para essa pesquisa foi que, às vezes, é mais fácil encontrar fatos
históricos longínquos do que recentes. Estes últimos estão guardados, muitas
vezes, apenas na memória das pessoas que os viveram ou presenciaram. Foi comum
ouvir dos entrevistados que seria difícil encontrar pessoas remanescentes dos
períodos em que aconteceram alguns dos fatos aqui relatados.
Embora se trate de uma pesquisa local,
entendemos que a preservação da memória e da experiência das gerações é tema
importante e merece maior atenção. Já em pesquisa anterior observamos que
algumas informações sobre fatos e personagens brasileiros só puderem ser
encontradas em sites internacionais (Freitas, 2009, p. 93).
Além de preservar essas histórias para o
conhecimento do público em geral, a possibilidade de que os dados reunidos
nessa pesquisa possam subsidiar o trabalho dos professores de Educação Física
também foi considerada. Visa enriquecer a sugestão do Currículo Oficial do
Estado de São Paulo para que se aborde o processo histórico das lutas no estudo
de cada modalidade (Secretaria Estadual de Ensino, 2012, p. 240 e 244).
Entendemos que as informações aqui reunidas, embora tratem de um período
histórico recente, podem aproximar a história das lutas ao contexto e realidade
de nossos alunos.
Precedendo essa pesquisa, outros projetos que
envolvem a história dos esportes e das lutas vêm sendo desenvolvidos na Escola
Estadual Prof. Odilon Corrêa, em Rio Claro, com diferentes objetivos e
abordagens: ensinar uma prova atlética partindo de seus relatos históricos
(Freitas, 2009); leitura compartilhada de texto produzido sobre a história do
boxe, com alunos da 3ª série do Ensino Médio – (Freitas y Matthiesen, 2014);
integrar a prática e o ensino da história dos lançamentos ao tema da força
centrífuga (Freitas y Matthiesen, 2015) [3], além do registro e
apresentação da história esportiva da própria escola para nossos alunos.
Espera-se que as informações aqui apresentadas
enriqueçam a história das lutas disponibilizadas nos materiais pedagógicos do Estado.
Em um próximo estágio dessa pesquisa pretende-se utilizar as informações aqui
organizadas em conjunto com as histórias de vida dos alunos que se relacionam
ao tema das lutas, a fim de desenvolver uma abordagem de ensino que melhor atenda
suas necessidades e expectativas.
Sobre a preservação da memória das lutas na
cidade de Rio Claro vale mencionar outra iniciativa: a realização do 1º
Encontro de Shihans, promovido pelos
professores Simone Pessoa e Vicente Paulo Kannebley Junior, no Clube de Campo
de Rio Claro, em 2014. Teve como objetivo homenagear os lutadores e professores
de judô que fizeram história na cidade.
Figura 3: Encontro
de Shihans no Clube de Campo de Rio
Claro (da esquerda para a direita: Lirio Generoso, Carlos Yabuki, “Bi”, Antonio
Yabuki, Gerdi Pereira, Odagyl Pessoa, Fernando Tamaru, Simone Pessoa, Luiz
Carlos Mubarack e Vicente Paulo Kannebley Junior).
Entre os temas das conversas que ocorreram
nesse encontro, foram relembradas as histórias da mulher que lutava no circo,
as aventuras, os personagens, os fatos cômicos e as recorrentes reclamações
sobre antigas contusões. Percebeu-se a maneira amistosa como esses professores
e lutadores tratavam de tais temas, rindo de si próprios e, sem qualquer traço
remanescente de rivalidade. Nesse estágio da vida cada contemporâneo
representava apenas um amigo que compartilhou das mesmas emoções de uma vida de
e nas lutas. Que boas lições e histórias, além das aqui apresentadas, teriam
essas e outras pessoas para compartilhar com os mais novos e, que privilégio
poder apreciá-las.
Referências
Freitas, F. P. R. (2013).
Caratê: possibilidades e observações ao Currículo Oficial do Estado de São
Paulo. (Trabalho de Conclusão de Curso). Faculdade de Educação Física.
Universidade Estadual de Campinas. Campinas.
Freitas, F. P. R. (2009). O
salto com vara na escola: subsídios para o seu ensino a partir de uma
perspectiva histórica. (Dissertação). Universidade Estadual Paulista. Rio
Claro
Freitas, F. P. R., y Matthiesen, S. Q. Os filhos do seu Zé Roberto:
memórias do boxe. EFdeportes.
Recuperado el 07 de septiembre de 2016 de:
http://www.efdeportes.com/efd190/seu-ze-roberto-memorias-do-boxe.htm
Freitas, F. P. R., y Matthiesen, S. Q. (2015). Sobre a força centrífuga nos lançamentos e as possíveis adaptações dos
relatos históricos ao ensino escolar. En: Abstract Book of 19 International
CESH Congress. Florença.
Muito mais ação jiu-jitsu. (2015).
Conheça as dez academias de jiu-jitsu mais bonitas do mundo. Recuperado el
13 de deciembre de 2015 de:
http://www.muitomaisacaojiujitsu.com.br/2015/03/as-10-academias-de-jiu-jitsu-mais-bonitas-do-mundo.html
Secretaria Estadual de Ensino (2012). Currículo do Estado de São Paulo:
Linguagens e Suas Tecnologias - Ensino Fundamental Ciclo II e Ensino Médio. São
Paulo.
[1] Hughes Jorge e Dr. Laércio Jorge
Martinez, de Campinas, foram pioneiros da luta de braço no Brasil. Suas
respectivas esposas foram medalhistas da modalidade em campeonatos mundiais (Confederação
Brasileira de Luta de Braço e Halterofilismo, 2015).
[2] Exemplo de vídeo disponível na
internet: <https://www.youtube.com/watch?v=ogRLgS7ILn4>. Situação
descrita aos 4.44 segundos.
[3] Projeto interdisciplinar
desenvolvido na E.E. Prof. Odilon Corrêa, como alunos da 3ª série do Ensino
Médio, durante o terceiro bimestre do ano letivo de 2015 e, posteriormente,
apresentado no XIX Congresso Internacional do Comitê Europeu de História do
Esporte, entre os dias 22 a 24 de outubro de 2015, em Florença, Itália.
Meu nome é Waldimir Luiz Rios Jr. tenho hoje 72 anos tive o Grande prazer de treinar iniciar no fisiculturismo com Waldemar Bíscaro, José Carlos o Leiteiro e o Esapetinho, bons tempos. Frequentei também por alguns anos academia Gonsalves/Mubarack juntamente com Uadi, Jose Carlos, Pexinho, Cottoni, Zeca, Odagil e o Amendoim o irmão mais novo dos Mubarak. Parabéns pelo trabalho me trouxe boas recordações.
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